O escudo invisível

10 de julho de 2013
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brabuleta

Quando decidi sair de casa, no comecinho de 2011, eu achei que o meu maior desafio seria me adaptar em uma cidade tão distante e cheia de desconhecidos como São Paulo. A imagem que eu tinha daqui era aquela do livro de geografia, sabe? Um monte de formiguinha cabeçuda se espremendo em uma avenida enorme. Cruz credo! Odeio multidões. Mesmo assim, eu vim. Era onde as coisas aconteciam, né? Eu não tinha parentes ou amigos de longa data por aqui, mas eu confesso que nem fiquei pensando tanto nisso. Afinal de contas, eu tinha dezessete anos e como quase toda adolescente do interior, estava fissurada na ideia de ir pra capital realizar todos os meus sonhos. E vai por mim, a lista era extensa.

Mas sou sortuda para caramba e tudo deu certo. Não porque as coisas boas simplesmente acontecem de graça na minha vida, muito pelo contrário. Sou sortuda porque consigo me adaptar muito rápido às escolhas que faço. Essa é uma característica fundamental para se sobreviver nessa selva de pedras (acho essa descrição legal). Eu diria que também no mundo dos adultos. Não é fácil no começo, mas com o tempo aprendemos a disfarçar melhor. Observar mais e falar menos. Bem menos, viu?

Então, lembro que logo nas primeiras semanas uma amiga me disse que eu precisava tomar cuidado com fulano. Aquilo me deixou um pouco assustada, mas tomei como um conselho bem intencionado e segui em frente. Gosto de tirar minhas próprias conclusões e continuei conversando com o cara. Na semana seguinte eu liguei a televisão em um final de tarde, coisa que eu quase não fazia, e lá me disseram que eu precisava tomar cuidado com os ladrões nas ruas. Os crimes eram os mesmos de antes, mas agora eles aconteciam no “quintal” do meu apartamento. Eles aconteciam na cidade onde eu moro. Pouco tempo depois eu tive uma experiência profissional muito desagradável. Eu era completamente inexperiente em alguns aspectos, principalmente na parte comercial do blog que envolve pagamentos e notas, então tive que rebolar para conseguir entender como a banda toca com determinadas agencias. Levei prejuízo, mas ganhei experiência. “Você precisa tomar mais cuidado com essas coisas!” me disseram.

Okay.

Pera aí. Okay nada.

Eu não sabia direito o que aquelas pessoas queriam dizer. Viver em uma espécie de campo minado não era exatamente o meu conceito de vida feliz, sabe? Mas pelo que entendi, se eu quisesse continuar riscando os itens da minha lista de sonhos, buscando estrelas, eu teria que me adaptar logo.

Agora, cá entre nós, como é que a gente faz isso mesmo? Ninguém sabia dizer.

Na verdade eu nunca falei diretamente sobre isso com muitas pessoas, então eu meio que ia ligando os pontinhos e montando minhas próprias teorias e técnicas. Aliás, é curioso mas maior parte dos meus amigos de São Paulo não nasceu aqui. E cada um deles tem uma história, um backgroud de vida completamente diferente do meu. Isso foi importante no processo de você-não-é-a-única-que-passa-por-isso-querida.

Os meses mudaram e um monte de coisa aconteceu. Ao mesmo tempo.

Eu tive que me defender. Sei que vocês me acham madura e tal, mas eu também sou sensível. E quando se é madura e sensível ao mesmo tempo, você simplesmente pega todos esses sentimentos que estão te matando e engole. De uma vez só. Porque você sabe muito bem que gritar para todo mundo que tá doendo não resolve nada. Fazer draminha é perda de tempo. A única coisa que muda, no final das contas, é a comoção das pessoas que estão ao redor e não tem nada a ver com aquilo.

Eu não sei vocês, mas eu detesto que desconhecidos sintam pena de mim quando estou no fundo do poço.

Pois bem, de tanto tomar porrada e me defender, quietinha como boa mineira que sou, eu criei algo que batizei de escudo (alguém tem um nome melhor?). Um escudo invisível. Ainda é só minha pele e, às vezes, as camadas de maquiagem e o traço fino do delineador, mas entre o que eu penso/sinto e o mundo ao meu redor, o mundo onde vivo agora, existe algo mais.  Não sei explicar, pouquíssimas pessoas além da minha mãe e o deu pai me viram sem ele. Não me entenda mal. Não é uma máscara ou algo do tipo. Não tem nada a ver com minha autenticidade. É como mantenho meus pés no chão.

Uma droga, eu sei.

Às vezes, eu me privo de sentir coisas, falar coisas e pensar coisas. Mentira. Penso coisas o tempo todo. Também faço, quando quero. Só que agora eu espero mais para colocar o meu coração na jogada. Vou devagarzinho com minhas expectativas, sabe? Para descobrir onde estou pisando. E foda-se o que os outros vão pensar. Pode ser o pior jeito, o mais demorado e complicado, mas, desculpa, é o meu novo jeito. E eu não faço a mínima ideia do tempo que isso vai durar.

Se tá certo? Não sei. Você sabe o que é certo? Então me explica quando a gente se encontrar.

*Ó, esse texto nasceu porque noite passada eu demorei a dormir (e tomei muito café). Acho que eu precisava organizar as ideias mesmo. Fiz tricô com aquelas antigas teorias e minha única conclusão (sinto muito) foi: o lugar mais complicado e instável que explorei nesse tempo todo em São Paulo foi a minha própria mente.

Ô labirinto complicado, sô!