você está lendo Entre aspas: Sem indireta, para endireitar

Digite aqui uma indireta para alguém.

Poderia ser a frase de abertura de qualquer atual site de redes sociais. Mas mais do que isso poderia ser a frase que a gente anda colocando como a principal no manual de instruções do que devemos estampar no coração da gente. Estamos lotando nossas falas, textos, fotos e pensamentos de indiretas. É como se a nossa vida virasse uma metáfora para o que sentimentos e por medo e covardia a gente calasse a verdade. Se o amor hoje em dia pudesse ser classificado em uma Era, seria a Era da Indireta. Talvez a Era da Paranóia (o que vão pensar do que eu falar?/será que falaram isso para mim?). É um tempo de amores que terminam antes de começar, porque o outro não nos dá a chance de conhecer quem realmente somos e se o que ele acha que somos não vale a pena, ele acha que não vai dar certo. E, sem conhecer, a gente segue achando sem nunca encontrar. Não adianta falar para o mundo inteiro e esquecer de dizer a quem de fato precisa. Não adianta achar que o outro sabe do que você fala, você não pode oferecer charadas ou adivinhações ao invés de amor e confiança.

Você não tem coragem de dizer a alguém que está apaixonado, pois tem medo de assustar. Não tem problema, algum trecho de música, filme, seriado, novela, livro, poema ou frase de pára-choque de caminhão pode ser publicada na Internet e, pronto, sua paixão está declarada. A saudade aperta e tudo perde um pouco a graça sem alguém ao seu lado. Mas dizer que sente falta pode soar desesperado, imaturo ou humilhante. Então, poucos dizem e muitos compartilham alguma foto em preto e branco e… concluído, já disse ao mundo que está tudo cinza, cinza de saudade.  Você erra e para não pedir perdão usa um contato mantido sem qualquer razão como indireta para dizer “me desculpa?”. Você não tem a honestidade suficiente de dizer a alguém que não gostou do físico dela quando a conheceu pessoalmente ou que por qualquer outro motivo não está mais a fim. Ao invés de dizer claramente “não” você usa seu silêncio como indireta. Ou você inventa alguma desculpa, tudo para não assumir que é apenas covarde.

Eu sei, a gente usa indireta para ver se a vida endireita e por mágica fica como a gente quer, a gente usa desculpas para tentar não magoar alguém e ter depois que de fato se desculpar pela dor causada. Eu sei, mas não basta, não basta porque o outro precisa entender. Você pode duvidar, mas distância nem sempre é a indireta perfeita para dizer que não está mais a fim ou para expressar que você foi magoado, da mesma forma estar sempre presente e disposto não é a indireta certeira para afirmar que você ama alguém. Isso tudo é só ter medo e deixar de dizer, é fugir, escolher ter e oferecer dúvidas. E criar um novo problema nunca foi a melhor solução.

No amor, pode não haver tempo. Pode não haver tempo não porque você vai morrer amanhã, mas porque alguém que você ama pode acabar desistindo de viver hoje ao seu lado. Pode não ter mais perdão para suas desculpas, pode não ter mais como endireitar o que você perdeu por tanta indireta. Amor não pode ser algo que se passa somente dentro da sua cabeça e que somente você vai entender. Amor precisa sim ser dito, ser claro ao ponto de quase ser clichê. Eu disse quase.  Às vezes as pessoas não estão prontas para ouvir a verdade ou as verdades do que sentimos, mas ainda assim diga e, se preciso, grite.

Digite aqui o você de fato sente por mim, para abrir a porta e poder ficar.

Texto escrito por Ruleandson do Carmo, Jornalista, 26 anos, BH/MG, mestre em Ciência da Informação, especialista em Criação e Produção para Mídia Eletrônica, professor do curso de Jornalismo da Ufop, é o personagem sem roteiro de uma comédia romântica sem fim e o vazio que une amores de cinema aos amores reais. Para saber mais, acesse  Eu só queria um Café.