você está lendo Vértices de um amor, Cap II

(Leia a o Capítulo I aqui )

Eu realmente tinha me esquecido o quanto ter um cara – de verdade – do lado era bom.

Tomamos sorvete, conversamos um pouco mais sobre a viagem e por fim, vimos um episódio de uma série americana que amávamos. Ele adorava imitar um dos personagens:

– Danie (toc toc), Danie (toc toc), Danie (toc toc). Já posso entrar no seu coração senhorita lágrimas?

– Seu (ex)nerd musculoso idiota, você nunca saiu dele.

O tempo passou tão rápido, já era hora de dizer adeus de novo. Ele se despediu com um abraço apertado e disse que estaria por perto amanhã cedo. Respirei fundo e fechei a porta. Olá de novo, solidão.

Meu quarto estava uma bagunça. Eu precisava dar um jeito na minha vida – Quem está escrevendo isso eu ou minha mãe? – O fato é que se eu realmente quisesse começar de novo, eu precisaria apagar algumas coisas que me prendiam ao passado. Apagar e-mails, fotos, depoimentos, e por último, arrancar a última folha de todos os meus cadernos da escola. Eu sabia que nada daquilo me faria mais feliz naquela noite, mas eu estava disposta a tentar. Tomei banho – sem pensar em lágrimas dessa vez – e depois de estar vestida com um pijama confortável e pega-frango, fiquei alguns minutos me olhando no espelho do banheiro. Por mais que as coisas tivessem mudado completamente, eu ainda era a mesma Danie de sempre. Indecisa, silenciosa e bipolar.

Foi naquele exato momento que percebi que não me adiantou de nada apagar e esconder todas aquelas coisas. Minha maior lembrança estava naquele reflexo, minha maior lembrança estava dentro de mim. Era hora de mudar meu reflexo no espelho, era hora de parar de lamentar. O que uma tesoura tem a ver com isso? Uma franja pode fazer coisas que você nem imagina.

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Acordar de madrugada era uma MERDA, acordar triste de madrugada era… Bem você sabe como é.

Pegar o celular para escutar músicas depois de ir um milhão de vezes na cozinha e voltar correndo com medo do escuro parecia uma boa ideia. Meu celular só tinha músicas com as palavras amor, love, você e eu, paixão… Preciso dizer mais alguma coisa? Lá vou eu mergulhar de novo – dessa vez de bomba – nas minhas lembranças.
Eu ainda conseguia sentir o perfume do Phelipe – acho que ainda não apresentei o idiota da história como deveria pra você vocês – no meu quarto. Isso só piorava as coisas.
As pessoas costumam dizer que tentar esquecer alguém não funciona, isso definitivamente não é verdade, nós conseguimos sim esquecer o outro, mas em pedaços, aos poucos. O problema é que nossa memória tende a apagar primeiro o que mais doeu. O que sobra então? Os abraços, os olhares, o perfume e o sorriso. Por isso os primeiros dias de solidão são sempre os mais dolorosos. Adormeci enquanto me odiava por não conseguir adormecer.

Tudo novo, de novo.

Bom dia árvores idiotas. Bom dia pessoas idiotas que ficam me olhando como se eu fosse a Lady Gaga vestida de carne. Bom dia carteira. Bom dia meu amo… Péssimo dia. Ele veio, eu podia sentir aquele perfume a quilômetros de distância. Atrás daquela parede amarela estava uma espécie de dispositivo que fazia meu coração disparar e queimar, digo, meu ex.
Respirar, olhar pra frente, rebolar. Respirar, olhar pra frente, rebolar.

Eu teria conseguido se ele não tivesse gritado meu nome. Ah, aquela voz. Respirei fundo e virei para trás como se eu não soubesse quem era o dono daquele timbre insuportavelmente gostoso.

– Nós precisamos conversar. – Sério Phelipe? Acho que na verdade eu quero te matar. Eu teria dito isso, mas a única coisa que saiu da minha boca foi:

– Quando?

– Agora, venha comigo. – Aquela sim era uma proposta tentadora, mas eu não poderia fazer isso. Por mim, e agora, por Matt. Ele não sentiria orgulho de me ver voltando atrás. Ok, algumas palavras e algumas verdades não fazem mal a ninguém. Lá vamos nós de novo.

Quando chegamos ao fundo da escola ele parou bem na minha frente e ficou me olhando nos olhos.

– O que foi? – Disse enquanto tentava não olhar para aqueles olhos azuis cor de céu.

– Eu sei que você está chateada comigo e não quer mais ver minha cara, te entendo. – Curioso. O idiota do século me entendia. – Eu admiro muito você, e se quer saber ainda te amo.

– Você o quê?

– Escute Danoni – o babaca costumava me chamar assim desde que eu derramei Danone em toda a sua jaqueta de Educação Física, acho que era uma espécie de punição – eu apenas não estou mais apaixonado por você. Eu não me imagino sem você, por isso tive medo de te contar antes. Medo de te perder. – Eu não consegui dizer nada, mas juro que quanto ele dizia aquela frase se passavam milhares de perguntas na minha cabeça. Por que os homens são tão bons em enganar idiotas apaixonadas?

– Eu realmente não me orgulho do que fiz, você tem todo direito de me odiar. Quero apenas que saiba que você ainda faz parte de mim, que nossa história foi a mais incrível que já vivi.

– Que ótimo, pois pra mim não foi. Fique aí com o seu final feliz – que eu costumava chamar de melhor amiga – porque a minha história definitivamente não terminou aqui.

Saí sem olhar para trás fingindo que nada daquilo havia acontecido. Pensei, Matt meu filho você precisa parar de chegar atrasado, mais uma dessas e eu não aguento. Surpresa, ele já havia chegado.

– Você estava aí? Nem te vi chegar. – Disse eu com o sorriso de eu-não-estava-falando-com-meu-ex, acredite em mim.

– Eu te vi, mas te achei ocupada demais para atrapalhar. – Droga, não funcionou.

– Ele me chamou para conversar, acho que realmente precisávamos conversar sobre algumas…

– Dan você não precisa me explicar nada, é sua vida, seus sentimentos e principalmente, o seu ex. Ah, e olha, sua melhor amiga – apontou ele para a porta.

– Ex! – Fiz questão de ressaltar.

– Que seja, a aula vai começar, assente-se por perto.

Mais presidentes. Mais átomos. Mais contas.

Intervalo? Por favor, não. Eu realmente não quero levantar dessa carteira e olhar para trás. Eu precisava ser confiante e parecer feliz. Sentei na mesa de Matt e conversei sobre assuntos irrelevantes. Rir ao falar sobre o tempo? Essa era minha tática de mocinha-feliz-sem-passado. Usar meu melhor amigo para esquecer barra impressionar barra judiar do meu ex-namorado era maldade, mas eu não tinha outra opção.

No caminho de volta pra casa Matt perguntou sobre a nossa conversa e eu disse exatamente o que tinha dito e escutado.

– Esse cara é um idiota. Eu realmente não sei como você foi se apaixonar por ele. – Fora os músculos, fora o sorriso, fora o cheiro, fora o bom humor, eu também não sabia o porque.

Matt morava longe, mas fazia questão de me levar todos os dias até a esquina da minha rua – na verdade ele parou de fazer isso quando comecei a namorar.

– Obrigada por estar sempre do meu lado, amigo.

– Eu é que tenho que agradecer por você emprestar o seu sorriso para os meus olhos – disse ele me fazendo cosquinhas sem parar. – Qualquer garota acreditaria que frases como aquela eram de um cara apaixonado. Não era assim, era o Matt. Meu melhor amigo fofo.

A aula havia acabado mais cedo, então, provavelmente naquele dia eu almoçaria com toda a família.

– Mãe, cheguei!

– Oi filha, como foi na aula? – Contar uma história típica de filme de sessão da tarde minutos antes do almoço? Não.

– Normal Mãe, o de sempre.

– Você está diferente, eu realmente acho que aconteceu alguma coisa. – Mães espertas são realmente um problema.

– Sério mãe, eu só tô cansada. Esse final de semana foi exaustante.

– Pois descanse, seu pai deve chegar amanhã e tem uma surpresa pra você.

Eu queria com todas as forças que a última invenção maluca do meu pai fosse uma máquina do tempo e que essa fosse a grande surpresa.

– Cadê o Wesley?

– Seu irmão saiu com alguns amigos, deve almoçar fora.

– Ótimo, eu como a carne dele. – Por mais que eu tivesse pena das pobres vaquinhas e porquinhos, EU AMAVA CARNE. Meu peso sempre esteve diretamente ligado com o estado emocional. Embora a maioria dos caras me considerassem a garota mais peculiar que já haviam conhecido até então, eu não era, nem nunca fui a mais bonita. Eu sempre me senti diferente, mas não como as outras garotas que queriam parecer diferente, eu simplesmente era, por dentro, por sotaque, por sorriso, por alma.

Liguei meu notebook e pensei, por que não dar uma espiada em como anda a vida virtual das pessoas? Na verdade o status do relacionamento do meu ex. Namorando? Comigo ou com minha melhor amiga? Será que ele não teve tempo de entrar na internet ou teve tanto tempo que já fez as mudanças necessárias? Aquela dúvida me corroeu. Hora de escrever. Vamos esquecer.

Escrever e esquecer são duas palavras que embora parecidas, não funcionam juntas. Enquanto eu escrevia, eu me lembrava. Enquanto eu me lembrava eu sentia necessidade de escrever. Organizar aquelas palavras que ainda queimavam no meu estômago e misturadas novamente com meus sentimentos eram uma dor necessária.

Eu realmente queria saber dizer o mesmo tanto que sabia escrever.

– Olha, um recado do Matt na minha página:

“Dan minha linda, escute essa música… Enquanto estive fora ela era minha maior lembrança sua. “The Best Years Of Our Lives – Evan Taubenfeld”

Baixando…

Pesquisei na internet e descobri que Evan é o melhor amigo da Avril Lavigne, minha cantora predileta. Que por sinal, é quem canta uma das músicas tema do meu antigo romance. Aquilo me deu uma vontade louca de escutar aquela música mais uma vez… Ops, melhor não, hora de dormir.

ZzzZzZzZzZzZzzZz

A semana passou assim, entre lágrimas, lembranças e sorrisos ao lado de Matt. Eu realmente queria fazer alguma coisa interessante no final de semana. Queria descobrir um novo motivo; ter aquela empolgação guardada na lembrança pra poder esquecer de vez e pensar: por que estou tão entusiasmada mesmo?

Meu pai não havia chegado como minha mãe havia dito, no-vi-da-de. Desde que o meu pai começou a trabalhar em um novo projeto maluco, que eu não sei como se diz o nome, ele nunca mais foi o mesmo. Eu percebia o olhar triste da mamãe, mas eu era egoísta o suficiente para me preocupar apenas com os meus problemas.

– Danieeeeeeeeeee, telefone pra você!

– Não precisa gritar mãe. – Eu tinha a sensação de ficar dez anos mais velha toda vez que ela gritava comigo.

– Alô?

– Oi Dan, aqui é o Matt. Posso te fazer um convite? – Uma coisa interessante e legal para o final de semana por favor, por favor, por favor!

– É o seguinte, todo começo de bimestre rola um acampamento no sítio em que o meu pai trabalha, é super divertido já fui várias vezes. O lugar é lindo e tem vistas incríveis. Vem comigo? – Passar o final de semana no meio do nada com o meu melhor amigo? Por que não?

– Claro! Eba! Obrigada por me chamar, agora já tenho um motivo para estar feliz.

– Quer dizer que o sítio é um motivo mais empolgante que eu?

– Ah Matt, você entendeu.

– Certo, passo na sua casa para te buscar mais tarde.

– Combinado.

Óculos de sol, mp4, protetor solar, chicletes… Mala pronta.

– Manhêêêêêê, sua filha de dezesseis anos vai acampar com o melhor amigo dela.

– Os pais deles estarão lá?

– Claro, mãe.

– Juízo menina, você não quer ter todos esses seus pequenos problemas multiplicados por dois, quer? – Eu não preciso ter um filho para ter meus problemas multiplicados por dois, eu preciso ter uma melhor amiga piranha.

Claro, eu não disse isso, apenas concordei com o que ela disse e fui para a sala esperar minha carona. Alguns minutos depois ele chegou sorridente. Eu conseguia sentir o seu perfume doce do último degrau da escada.

– Venha, me ajude.

– É pra já senhorita. – Ele pegou minhas duas malas com apenas uma mãe e sorriu me puxando com a outra. Quando meu melhor amigo tinha se tornado um cara gostoso? Isso era inacreditável. Ele sempre foi o nerd, com espinhas e aparelho da sala.

– Olá pais do Matt, olá cachorrinho fofo do Matt.

Depois de meia hora de viagem, o silêncio havia tomado conta do veículo. Enquanto a paisagem passava pelo vidro do carro, não pude deixar de sentir falta de Phelipe. Nós costumávamos sair sem destino pelas estradas da redondeza sempre que a tarde parecia monótona. Acho que ele resolveu fazer isso com o nosso namoro, sair sem destino por aí. Eu odiava muito estar ali perdida e – quase – sozinha.

Continua.